O Brasil atingiu em 2016 o maior número de mortes violentas intencionais, como homicídios e latrocínios, da sua história: 61.619 vítimas, o equivalente a 168 óbitos por dia, sete por hora. Os dados foram revelados nesta terça-feira, 30, pelo 11.º Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que mostrou ainda piora em outros índices de criminalidade, como o de policiais assassinados e de mortos por policiais, roubo e furto de veículos e estupro. O recrudescimento da violência acontece em um momento de queda de gastos do governo federal e dos Estados no setor. Pesquisadores pedem que o tema assuma destaque na agenda política dos gestores para reversão do cenário.
A cada ano, o Fórum, para chamar atenção para a gravidade do número, escolhe uma medida de comparação em relação ao total de assassinatos. Após usar a guerra da Síria no ano passado, agora foi a vez da bomba atômica que explodiu sobre Nagasaki em 1945, durante a 2.ª Guerra Mundial. Os mais de 61 mil mortos por ano no Brasil equivalem às mortes provocadas no momento da explosão.
Os assassinatos representam hoje quase a metade (47,8%) das causas de morte de jovens de 15 a 29 anos no Brasil, e a taxa de homicídios por 100 mil pessoas nessa faixa etária cresceu 17,2% entre 2005 e 2015 após ter começado a apresentar sinais de estagnação na década passada. Essa é uma das constatações do Atlas da Violência 2017, relatório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que se baseia no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, para analisar a questão no País.
De acordo com o levantamento, que está sendo divulgado nesta segunda-feira, 5, em 2015 aconteceram 31.264 homicídios de jovens no Brasil - esse é o fator preponderante para as mortes desse público ante outras causas como acidentes de trânsito e doenças em geral.
Os pesquisadores destacam que até a década passada parecia que essa tendência de vitimização juvenil vinha perdendo força, já que entre 2000 e 2010 o incremento na taxa de mortes havia sido de 2,5%, ante 20,3% nos anos 1990 e 89,9% em 1980.
"Contudo, os últimos dados disponíveis do Ministério da Saúde nos mostram um recrudescimento do problema", descreveram os pesquisadores.
Vulnerabilidade social, explicitada também pelas deficiências na educação básica, ajudam a entender o cenário, dizem os pesquisadores.
"Não se investe adequadamente na educação infantil (a fase mais importante do desenvolvimento humano). Relega-se à criança e ao jovem em condição de vulnerabilidade social um processo de crescimento pessoal sem a devida supervisão e orientação e uma escola de má qualidade, que não diz respeito aos interesses e valores desses indivíduos", afirmam. "Quando se rebela ou é expulso da escola (como um produto não conforme numa produção fabril), faltam motivos para uma aderência e concordância deste aos valores sociais vigentes e sobram incentivos em favor de uma trajetória de delinquência e crime."
O porcentual de homicídios como causa de morte entre os jovens sobe ainda mais se o recorte for feito para pessoas de 15 a 19 anos: 53,8%.
"O que se observou nos dados é um futuro da nação comprometido. Entre 2005 e 2015, nada menos do que 318 mil jovens foram assassinados", escrevem os pesquisadores. A taxa de assassinatos na faixa etária é de 60,9 ante 28,9 da média brasileira geral.
Por Estado, o quadro é considerado heterogêneo, com São Paulo conseguindo reduzir 49,4% dos homicídios de jovens entre 2005 e 2015, enquanto no Rio Grande do Norte a elevação registrada foi de 292,3%.
"Enquanto isso, a sociedade, que segue marcada pelo temor e pela ânsia de vingança, parece clamar cada vez mais pela diminuição da idade de imputabilidade penal, pela truculência policial e pelo encarceramento em massa, que apenas dinamizam a criminalidade violenta, a um alto custo orçamentário, econômico e social", analisam os especialistas, entre eles o pesquisador do Ipea Daniel Cerqueira, o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança, Renato Sérgio de Lima, e a diretora executiva do Fórum, Samira Bueno.
Da Redação com informações do Estadão
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