Criada para dar celeridade às compras públicas, Atas de Registro têm sido usadas para driblar a Lei de Licitações, pagar propinas a agentes públicos e enriquecer atravessadores.
E o que é essa ata? É uma espécie de cadastro para as compras públicas. Uma referência de preços que ajuda as licitações. Vale para um órgão municipal, estadual ou federal.
Aplicada de forma correta e legal, as Atas de Registro contêm informações precisa, como o objeto, ou seja, um produto ou serviço que o poder público pode comprar ou contratar; os preços, as especificações e quantidades; o fornecedor; o órgão que gerencia a ata, os participantes e as condições gerais, como prazos pra entrega.
Isso dá agilidade ao processo de aquisição, porque uma cidade de uma região do país que precisa comprar material hospitalar pode pegar carona na ata de uma licitação feita por um estado de outra região do Brasil, seguindo os preços que o fornecedor cadastrou na ata.
Até aí, tudo bem.
O problema foi o esquema fraudulento distorcendo o uso das Atas de Registro no Rio Grande do Sul. De acordo com a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instaurada pela Câmara de Vereadores de Porto Alegre, milhares de livros adquiridos por preços maiores do que o normal estavam em um almoxarifado da Secretaria Municipal de Educação. Encharcados, não têm uso. Abandonados, os livros não chegaram aos estudantes. Esquecidos, as obras serviram de pretexto para o pagamento de propina para quem vendeu, quem intermediou e quem recebeu os livros.
O mesmo assunto virou inquérito na Polícia Civil. Da mesma forma que o relatório final da CPI, o delegado encarregado das investigações não tem dúvida quanto à ilegalidade das Atas de Registro. Os atravessadores traziam o documento pronto, definindo os detalhes de como o edital deveria ser feito para que determinada empresa fosse a vencedora do processo licitatório.
Em outra cidade gaúcha, Pelotas, a Polícia Federal chegou à idêntica conclusão: a oferta de propinas a funcionários públicos e prefeitos gerou uma série de compras de diferentes bens, causando danos ao erário e garantindo enriquecimento ilícito.
Após a exibição da reportagem do Fantástico deste domingo (9), os supostos atravessadores ou representantes, mesmo com todas as reuniões gravadas, disseram que nenhuma das denúncias tem comprovação.
Veja mais sobre o esquema no Rio Grande do Sul
A Polícia Civil afirma que esquema envolveu propina para compra de imóvel. Sete pessoas foram presas. Do outro lado da notícia, a ex-vereadora Mari Pimentel, filiada ao Republicanos e vereadora até o fim do ano passado, presidiu uma das CPIs que investigaram essa história.
“São 38 milhões de reais que a gente comprou desse fornecedor tem mais de um ano. A gente abriu a CPI, viu o esquema de fraude em licitação e aqui tá apodrecendo na enchente, num depósito, mais de um ano depois”, conta a ex-vereadora.
“Foi praticamente forjada uma simulação de preços, uma apresentação de orçamentos. Ou seja, era algo de cartas marcadas, era algo direcionado”, afirma o delegado Max Otto Ritter.
Sete pessoas chegaram a ser presas, entre elas, Sônia da Rosa, Secretária de Educação de Porto Alegre quando o município comprou os livros, em 2022.
“Nós temos provas nos autos de que um apartamento foi adquirido logo após essas contratações ou em meio a elas. E parte do valor desse imóvel, cerca de 300 mil reais, se deram a título de propina”, afirma o delegado.
Defesa
A defesa da ex-Secretária informou que só vai se manifestar nos autos.
A Prefeitura de Porto Alegre afirma que o prefeito Sebastião Melo, do MDB, "tomou todas as medidas necessárias para corrigir o que precisava ser corrigido" e "repudia qualquer uso indevido de dinheiro público”.
A Secretaria de Educação diz que a distribuição dos livros "seguia um cronograma" e que "seriam entregues no segundo semestre de 2024", se a enchente não tivesse acontecido.
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