Apesar de ser objeto de pesquisas desde os anos 1970, só mais recentemente, há coisa de uma década, a poluição dos recursos hídricos causada por micro (MP) e nanoplásticos (NP), bem como seus efeitos sobre as águas, a fauna, os seres humanos e o meio ambiente, entrou de vez no radar de cientistas e organismos internacionais. As pesquisas, embora incipientes, já apontam uma gama de problemas que podem resultar dessa “doença moderna”.
Os microplásticos, partículas com diâmetro entre 0,1 e 5 mm, estão amplamente distribuídos em oceanos, rios, lagos, reservatórios, estuários, regiões polares, estações de tratamento de esgoto e água potável.
De acordo com dados da Plastics Europe, associação comercial que representa fabricantes de plásticos daquele continente, a produção global do setor atingiu 368 milhões de toneladas em 2020. Estima-se que, desse total, 94% sejam destinados a aterros sanitários ou liberados no meio ambiente natural.
O artigo “Peixe e plástico em ecossistemas de água doce: contribuição da ciência brasileira e pesquisas futuras”, de diversos autores, revela que o Brasil ocupa o 4º lugar no ranking dos maiores produtores de resíduo plástico no mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, China e Índia. Anualmente, o país gera cerca de 11,4 milhões de toneladas de resíduos.
O trabalho integra a publicação “Microplásticos nos ecossistemas: impactos e soluções”, editada pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, em 2022, e organizada pelos pesquisadores Marcelo Pompêo, Bárbara Rani-Borges e Teresa Cristina Brazil de Paiva. No prefácio, vem o alerta: “Os estudos recentes sugerem que, a seguir com o uso generalizado que fazemos, e com o pouco cuidado que temos no adequado reuso ou descarte daqueles plásticos que consideramos desnecessários, o plástico tem o potencial de ser o mais importante contaminante ambiental do planeta”.
Partículas com diâmetro entre 0,1 e 5 mm, os microplásticos estão amplamente distribuídos em oceanos, rios, lagos, reservatórios, estuários, regiões polares, estações de tratamento de esgoto e água potável.
Um dos múltiplos impactos dessa modalidade de poluição é sobre a vida aquática. Pesquisa de 2020 da bióloga Bruna Urbanski analisou os índices de plásticos encontrados no curimbatá, espécie amplamente consumida no Brasil, e localizou essas partículas no trato digestivo de cerca de 72% dos peixes estudados.
A pesquisa, que alçou Urbanski, no meio do percurso, do mestrado ao doutorado em Ecologia de Ecossistemas pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu, concentrou-se no Rio Tietê e em seu afluente Rio do Peixe, em São Paulo. Foi o “primeiro relato de ingestão de MPs por essa espécie no Brasil”. Antes “só havia estudos em sistemas estuarinos e em dois outros rios”. Urbanski, nas atividades em campo, viu “um Tietê de água e outro de plástico”, com “oxigênio zero desde a superfície”.
Caminho aberto, os rios conduzem ao mar tudo o que recebem. O efeito é que as espécies marinhas, de plânctons e moluscos a aves, tartarugas e mamíferos, enfrentam riscos de envenenamento, distúrbios comportamentais, fome e asfixia. Corais, mangues e ervas marinhas também são sufocados por detritos que os impedem de receber oxigênio e luz.
O corpo humano é igualmente vulnerável à contaminação por MPs, pela água “potável” ou ingeridos através de peixes, frutos do mar e até mesmo sal comum. Além disso, os MPs e NPs podem penetrar na pele ou serem inalados do ar.
Os estudos apontam para riscos de alterações hormonais, distúrbios de desenvolvimento ou metabólicos, neurotoxicidade, aumento do risco de câncer e anormalidades reprodutivas, essas últimas “já verificadas em peixes”, aponta Bruna Urbanski.
Marcelo Pompêo, doutor em Ciências da Engenharia Ambiental e professor da USP na capital paulista, afirma: “O NP poderá ser transferido de uma célula para outra. Já foi detectado na placenta, no sangue, mas não se sabe o que poderá causar”. Urbanki acrescenta: houve detecção também “no leite materno, na placenta e em fezes de bebês”.
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