Embora mais de 11 mil quilômetros separem a Ucrânia do Brasil, a questão vivida pelo país europeu neste momento interfere na vida de todos os brasileiros. Isso acontece porque a possibilidade de um conflito armado já vem pressionando o preço do barril de petróleo no mercado internacional, já que a Rússia é um importante produtor da commodity. O valor vem batendo recordes em 2022, chegando a ser cotado acima de US$ 95 - uma alta de 9% em apenas um mês.
Além do impacto inevitável nos postos de gasolina, a alta internacional no preço do barril também provoca uma elevação em toda a cadeia produtiva do Brasil, especialmente por interferir na fabricação de plástico e na indústria petroquímica, dois setores que servem como base para outras áreas econômicas.
O plástico, por exemplo, está presente em praticamente todos os produtos consumidos no país, da embalagem de um pacote de biscoito a boa parte dos componentes de um veículo. A subida no valor do petróleo ao longo da pandemia impactou a fabricação do plástico e, consequentemente, tudo que depende dele.
“Antes do problema na Ucrânia, o plástico já havia tido um aumento de 100% durante a pandemia. Algumas resinas chegaram a ter um crescimento de 150%”, afirma José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast).
Mas ele acredita que o valor alto do barril não deve perdurar por muito tempo. “A demanda no mundo todo diminuiu, esse ano é apontado como de menor nível de atividade para maioria dos países, e a tendência é do preço do petróleo cair, porque não vai haver demanda. A Rússia não tem interesse em deixar de vender petróleo e gás. Mesmo para os membros da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) subir tanto o preço é ruim, porque eles precisam de demanda”, argumenta.
A alta do petróleo também impacta a indústria química, responsável por fornecer produtos para montadoras, fábricas de calçados e construção civil, por exemplo. Fátima Giovanna Coviello Ferreira, diretora de Economia e Estatística da Associação Brasileira de Indústria Química (Abiquim), explica que do petróleo se retira a nafta petroquímica, matéria-prima fundamental para a indústria. A tonelada do produto custa, em média, nove vezes o valor do barril do petróleo e chegou a US$ 772, alta de 56% em um ano.
“Tanto o produto do mercado doméstico quanto o importado estão sofrendo altas muito elevadas no período recente. É um problema internacional. Existe uma elevação na demanda combinada a uma retração na oferta de petróleo no mundo”, explica Fátima. “Isso impacta toda a cadeia. Automóveis têm uma parte expressiva de produtos químicos, a construção civil tem argamassa, conexões de tubo PVC, tintas. A química permeia toda a transformação brasileira, mas também o setor de serviços e a agricultura”.
Os representantes de Abiplast e Abiquim defendem que, para resolver essa questão a longo prazo, o país deveria investir em indústrias, fomentando uma maior concorrência e uma menor dependência do mercado exterior. Para Fátima, isso criaria mais empregos e permitiria ao país importar menos produtos químicos - hoje o déficit na balança comercial do setor é de US$ 46 bilhões.
A especialista da Abiquim reforça ainda que o preço do gás natural é indexado ao valor do petróleo. Dessa forma, sempre que o barril tem uma elevação, o gás tão importante para a produção industrial brasileira também passa por um aumento.
Freio na retomada da economia
Analista de estudos econômicos da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Marcos Marçal explica que é muito difícil mensurar o impacto da alta do barril sobre a economia brasileira. “Os efeitos são muito espraiados. Os custos de produção aumentam por causa da matéria-prima e por causa do transporte, tanto marítimo quanto rodoviário. Os empresários acabam ficando com a margem de lucro espremida e isso dificulta os investimentos e a contratação de funcionários”, explica.
Para o consumidor final, inflação pode significar redução nos gastos e, consequentemente, um menor crescimento no Produto Interno Bruto (PIB). Marçal aponta ainda que o poder de compra do brasileiro vai ficar ainda mais achatado pela alta dos combustíveis. “Muitas vezes as pessoas que gastaram mais com transporte vão deixar de consumir outros itens”.
Paulo Casaca, professor de economia do Ibmec-Minas, acredita que não há como fugir do efeito da alta do petróleo neste momento. “No longo prazo, é possível diversificar e utilizar compostos parecidos com plástico que não usem petróleo como insumo, mas isso depende de desenvolvimento de novas tecnologias”, afirma o professor.
“O mundo investe nesse tipo de pesquisa, tanto que hoje temos carro elétrico e plástico de outras fontes. Mas o petróleo continua sendo usado pela facilidade de uso e pelos custos de produção. Mesmo quando pode ser substituído, tem que se levar em conta as variáveis do substituto, como acontece com o etanol”, completa.
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