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País que mais mata: Brasil registrou o assassinato de 140 pessoas trans em 2021

30/01/2022 às 20h41
Por: Redação
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Dia (29) foi comemorado o Dia da Visibilidade Trans, e os desafios ainda são gigantes para essa parcela da população. Em 2021, foram registrados 140 assassinatos de pessoas trans no Brasil. Deste total, 135 tiveram como vítimas travestis e mulheres transexuais e cinco vitimaram homens trans e pessoas transmasculinas.

O número foi menor do que o do ano anterior, quando foram registrados 175 assassinatos de pessoas trans. Mas foi superior ao de 2019, no período pré-pandemia, quando foram contabilizados 124 óbitos. O número de 2021 está acima da média desde 2008, de 123,8 homicídios anuais de pessoas pertencentes a esse segmento.

Os dados estão no Dossiê Assassinatos e Violências Contra Travestis e Transexuais Brasileiras em 2021. O estudo foi realizado pela da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) com apoio de universidades como a Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Federal de São Paulo (Unifesp) e Federal de Minas Gerais (UFMG).

O Brasil foi, pelo 13º ano consecutivo, o país onde mais pessoas trans foram assassinadas. Em relação à distribuição geográfica, São Paulo foi o estado com mais homicídios (25), seguido por Bahia (13), Rio de Janeiro (12) e Ceará e Pernambuco (11). Além dos casos no Brasil, foram identificados dois assassinatos de brasileiras trans em outros países, um na França e outro em Portugal.

Os perfis das vítimas não puderam ser completamente traçados. Dos assassinatos com informações sobre a idade – 100 casos -, 53% tinham entre 18 e 29 anos; 28% entre 30 e 39 anos; 10% entre 40 e 49 anos; 5% entre 13 e 17 anos e 3% entre 50 e 59 anos. Quanto à raça, 81% das vítimas se identificavam como pretas ou pardas, enquanto 19% eram brancas.

As principais vítimas foram as profissionais do sexo – 78% das pessoas mortas identificadas na pesquisa. Segundo a autora, esse perfil majoritário das vítimas indica pessoas “empurradas para a prostituição compulsoriamente pela falta de oportunidades, onde muitas se encontram em alta vulnerabilidade social e expostas aos maiores índices de violência, a toda a sorte de agressões físicas e psicológicas.”

O texto informa que as pessoas trans também sofreram intensamente os efeitos da crise sanitária, econômica e social da pandemia da covid-19, com dificuldade de acesso a auxílios governamentais e de obtenção de empregos em empresas.

A pesquisa chama a atenção para a dificuldade de obtenção de dados. Isso ocorre pela ausência de um recorte que contemple as pessoas trans nas estatísticas de secretarias de segurança e de instituições de direitos humanos que recebem denúncias de violações, como no caso do Disque 100.

“Nos casos de assassinatos, muitas vezes esses dados se perdem nos próprios registros de ocorrência. Da mesma forma, nos laudos dos Institutos Médicos Legais, ignora-se a identidade de gênero da pessoa, se destoante do padrão sexual binário”, pontua a autora do estudo, Bruna Benevides.

A autora destaca que há um crescimento de iniciativas com repercussões na ampliação da violência contra pessoas trans e que esse segmento é o que sofre mais violações de direitos humanos entre a comunidade LGBTQIA+.

“Temos assistido a um levante contra as discussões sobre linguagem inclusiva de gênero para pessoas não-binárias, projetos de lei antitrans e o discurso que incluiu o ódio religioso contra direitos LGBTQIA+ tem ganhado mais espaço, trazendo impactos significativos no dia a dia”, observa.

Violência política

O texto cita também a violência contra políticas eleitas trans. Foram registradas no ano passado ameaças de morte contra a vereadora de Niterói Benny Briolly (Psol/RJ), levando-a a deixar o país.

A vereadora de Belo Horizonte Duda Salabert (PDT/MG) também virou alvo de ameaças de morte na capital mineira. A vereadora Érika Hilton (Psol/SP) teve o gabinete invadido e passou a ter que circular com seguranças para coibir ataques.

Papel do Estado

O dossiê critica a falta de ações dos governos, parlamentos e entes estatais para combater a violência transfóbica. A falta de respostas do Estado atinge também adolescentes trans, que em geral sofrem com a falta de acolhimento no seio familiar e nas escolas.

Ele apresenta recomendações ao Poder Público para enfrentar o cenário de violência contra a população trans. O documento também defende o reconhecimento pelos órgãos estatais da autodeclaração de gênero das pessoas trans e diversas, o que inclui a acolhida nos abrigos públicos. O texto coloca a importância da inserção nos currículos de temas de educação sexual inclusiva.

O documento sugere mutirões em órgãos de assistência social para emissão de documentos e inclusão em programas para população LGBTQIA+. O texto advoga por medidas específicas de proteção das profissionais do sexo e pelo impedimento da prisão de pessoas nessa atividade.

Entre as recomendações, ações de apoio à comunidade trans para enfrentar condições de vulnerabilidade à fome, como a distribuição de alimentos e itens de higiene e de proteção contra a covid-19 para a população LGBTQIA+.

Para as forças de segurança, o dossiê recomenda a criação de protocolos policiais para combater a violência contra a população LGBTQIA+, a formação e sensibilização dos agentes e a inclusão desse recorte nas estatísticas e na sistematização dos dados sobre assassinatos e violências.

Ratificação de documentos

Desde 2018, pessoas transexuais podem buscar cartórios de registro civil no país para corrigir seu primeiro nome e seu gênero na certidão de nascimento ou casamento e, a partir daí, modificar os outros documentos pessoais.

Quase quatro anos após essa conquista, no entanto, ativistas transexuais e defensores dos direitos humanos ouvidos pela Agência Brasil para o Dia da Visibilidade Trans, celebrado hoje (29), apontam obstáculos à efetivação desse direito e se mobilizam para que a população tenha acesso a documentos que respeitem sua identidade de gênero.

Para a presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Keila Simpson, as barreiras já começam nos custos de obtenção das certidões necessárias para realizar o pedido no cartório, que incluem gastos com o deslocamento para ir aos órgãos solicitá-las.

Superada essa etapa, a retificação do registro civil no cartório também requer o pagamento de taxas que variam de estado para estado. Keila explica que a informação de que é possível solicitar gratuidade nem sempre chega à população.  

“A burocracia existente e a não gratuidade são um grande empecilho. Estou falando de uma população que vive em subemprego, não tem recursos muitas vezes, e que tem que pagar pelas certidões. Para muitas pessoas pode parecer valores irrisórios, mas para as pessoas trans é significativo e muitas não têm como pagar”.

Keila foi uma das ativistas trans que estiveram no Congresso Nacional, em 29 de janeiro de 2004, para um ato por respeito que foi considerado histórico e definiu a data do Dia Nacional da Visibilidade Trans.

A presidente da Antra recomenda que pessoas trans que não saibam como pedir a correção de seus documentos procurem defensorias públicas e organizações de defesas dos direitos humanos de sua região para buscar orientações. Além disso, ela indica que há guias disponíveis na internet, como no próprio site da associação.

“A pessoa vai vivendo sem se identificar e passa por dificuldades, por violações de direito, por constrangimento público quando precisar apresentar o documento. E ela vai continuar sofrendo essas violências que ela sofre porque tem uma burocracia nesse processo que precisa ser vencida”, afirma Keila Simpson.

A Agência Brasil entrou em contato com o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos sobre as políticas voltadas à população trans e aguarda retorno.

Com Agência Brasil

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