O cenário para a realização do Carnaval 2022, que seria daqui a menos de dois meses e meio, não é favorável, mesmo com a redução de casos e mortes em Minas Gerais e o avanço da vacinação, segundo especialistas ouvidos pela reportagem. Para o infectologista Unaí Tupinambás, a pandemia é dinâmica, e a quarta onda que atinge os Estados Unidos e a Europa deve ser vista com preocupação no país. “Não tem como prever com tanta antecedência (os indicadores), ainda há as festas de Natal e Ano-Novo”, ressaltou o especialista, que é professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Ele também lembrou a magnitude da festa, que costuma, durante os quatro principais dias da folia, multiplicar a população das cidades que recebem os eventos. Outro fator importante, segundo ele, é a chegada da variante ômicron, que, diante de tantas mutações do vírus, ainda é estudada pelos cientistas. “Não temos ideia do que ela pode causar, pode ser tão letal quanto a gama e a delta, tão transmissível ou mais transmissível que a delta, e ainda pode evadir da resposta imune. Então, não é o momento para relaxamento total”, alegou.
Estudos das fabricantes das principais vacinas com relação à eficácia dos produtos sobre a variante só começaram a ser divulgados neste mês. No caso da Pfizer, é necessário ter uma terceira dose. Já o Instituto Butantan, que produz a Coronavac no Brasil, está em fase de análises. Dados preliminares da AstraZeneca apontam a eficácia do imunizante. No entanto, segundo Unaí Tupinambás, ainda é cedo para tirar conclusões.
“Além das duas doses da vacina e do reforço, precisamos manter o distanciamento físico, evitar aglomerações em lugares fechados e manter o uso de máscaras. A população tem que entender que a pandemia não acabou. Estamos no caminho da transição para uma forma que chamamos de ‘endemia’, mas, neste momento, não podemos ter esses grandes eventos, que podem nos colocar em risco, retroceder aos patamares de março e abril deste ano”, explicou Tupinambás.
Segurança
Presidente da Sociedade Mineira de Infectologia, Estevão Urbano reforçou que há grandes dificuldades em garantir a segurança das pessoas tanto no Carnaval quanto em outras festas que provoquem aglomerações. “São locais em que os comportamentos não respeitam o distanciamento, a higiene das mãos e o uso de máscara, que evitam a infecção pelo vírus”, acrescentou. Segundo ele, esses eventos podem intensificar o número de transmissões, principalmente por conta dos deslocamentos entre as cidades.
“As vacinas não dão uma proteção absoluta, de 100%, e muitas delas ainda não têm a dose de reforço e já podem estar com a imunidade reduzida. Vai perdendo a imunidade com o tempo. Um exemplo claro é a Europa, onde, mesmo sem o fenômeno da nova variante, houve vários países com piora dos casos que levaram a morte”, argumentou.
Blocos recomendam suspensão de desfiles
Manifestações independentes podem acontecer na capital mineira em 2022, ainda que sem apoio da prefeitura em planejamento e patrocínio das iniciativas. No entanto, a orientação da Liga Independente dos Blocos de Santa Tereza (Si Liga), que reúne 23 agremiações, orienta a suspensão dos desfiles na cidade justamente por causa das incertezas das condições sanitárias. A recomendação consta em nota conjunta da entidade, apresentada na semana passada.
Presidente da Si Liga, Kerison Lopes, que também faz parte do Volta, Belchior, lembrou que, apenas no cortejo do bloco, mais de 100 mil estiveram nas ruas em 2020.
“Mesmo que acontecesse um milagre e a pandemia acabasse, o Carnaval de rua depende de uma preparação grande, de no mínimo seis meses, envolvendo o poder público e os blocos. E isso não foi feito pela prefeitura. Juntando esses dois fatores, definimos que não vamos fazer desfile de rua”, disse. Os blocos cogitam realizar eventos fechados menores, para que possam se apresentar e sobreviver a mais um período sem o Carnaval de rua.
“Ninguém sabe como estará em fevereiro, mas, pela realidade atual, são permitidos eventos, e muitos já estão programados para a época (com shows como Ivete Sangalo e Wesley Safadão). Só que não têm nada em comum com a festa da cidade, e nenhum bloco foi contratado”, alegou.
Crítica
Kerison Lopes pontuou que BH adotou postura inversa à de outras capitais que têm grandes festas, como Rio e Recife. “Foi a única cidade que não fez nada. Nas outras, preparam a festa, os blocos e escolas de samba estão inscritos e recebem auxílio. Todos vão fazer uma análise em janeiro, para saber como estará a situação”, disse.
Lopes enfatizou que, se a medida fosse realizada na cidade, toda uma cadeia poderia ser movimentada. “Mesmo com a imprevisibilidade, teríamos as costureiras trabalhando, o reflexo no comércio. Se não fosse possível fazer a festa, poderia ser adiada para outra época. Nunca vi ninguém defender o Carnaval a qualquer custo”, criticou.
O que dizem moradores de BH
“No momento, não deveria ter o Carnaval, porque a população ainda não está 100% imunizada. É necessário esperar.”
Gilmara Medeiros, 47, secretária
Eu acho que não deve (haver folia). Vivemos agora com uma nova variante. Muita aglomeração pode ser bem perigoso.”
Jean Malaquias, 22, eletromecânico
“Sei que ainda estamos vivendo na pandemia, mas é possível fazer (Carnaval) se cada um tomar devidos cuidados, como usar máscara.”
Maurízia Gonçalves, 35, nutricionista
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