Quem aprende mais rápido? Um pet que tem dono ou um cão de abrigo? O resultado de uma pesquisa feita com cães de três ONGs de Belo Horizonte surpreendeu especialistas e mostrou que animais abrigados podem aprender mais rápido que os domiciliados.
A pesquisa da bióloga Maria Luiza Antunes Fonseca, colaboradora do Grupo de Estudos em Bem-Estar Animal da PUC Minas, foi feita com 15 cães de companhia e 14 de abrigos. Eles foram treinados durante oito sessões, para aprender comandos básicos, de sentar e dar a pata. E sempre que acertavam ganhavam um petisco como recompensa.
A pesquisadora explica que uma das hipóteses era de que os cães que não têm tutores e vivem em abrigos demorariam mais pra aprender.
“Durante a domesticação os cães foram selecionados para interagir e comunicar com os humanos. Isso é bom para os dois lados. Mas os cães de abrigo tem muito menos interação com as pessoas, então, até pela literatura da área, a gente achava que eles iam ter mais dificuldade de aprender. Mas não foi o que aconteceu”, explica ela.
Duas pesquisadoras foram até os três abrigos (Ministério Arca de Noé, Pousada Cão Alegria e Casa de Passagem Neverland) e às casas dos pets voluntários. A única exigência era que eles não soubessem sentar e dar a patinha quando solicitados, não importando idade, raça ou porte do animal.
Os principais achados da pesquisa surpreenderam: os cães de abrigo respondiam mais rápido, necessitavam de menos repetições e atendiam a mais comandos por sessões.
Uma das melhores “alunas” foi a cadelinha Joana, que vive no abrigo Neverland. Maria Luiza conta que ela aprendeu os truques em duas sessões. “Parece que uma alavanca acionou no cérebro dela. Impressionante. Ela respondeu a tudo muito rápido,” conta a pesquisadora. Outra aluna nota 10 foi a também vira-lata Safira, da Pousada Cão Alegria.
A pesquisadora diz que sempre usava uma folha de EVA vermelha no chão no momento dos ensinamentos e que a Safira entendeu rapidinho que, se fosse para cima da folha, tinha aula e tinha petisco.
Cães de abrigo aprendem e rápido
Para a bióloga, a maior lição que ficou da pesquisa foi a de que os cães de abrigo, mesmo tendo menos oportunidade de interagir com as pessoas, são capazes de aprender não apenas truques como os que foram ensinados, mas também de assimilar comportamentos e conviver bem com possíveis tutores.
Para a responsável pela ONG Arca de Noé, a veterinária Paula Maia a experiência foi mais do que positiva. “Nossos animais tiveram aceitação muito boa e que, mesmo o histórico de abandono, não impediu que aprendessem tão bem ou melhor que os animais domésticos. Sem falar que aprendem com amor, né? A gente, independentemente se é de raça, se é 'viralatinha', se foi comprado ou adotado, o fato é que eles sabem amar melhor que o ser humano. É um amor incondicional, um amor grato. E que fique aí então o incentivo aí para as pessoas procurarem abrigos, vários em BH estão lotados”, disse.
Na Casa de Passagem Neverland, nove cães participaram do projeto. Desses, três foram adotados. Já na Cão Alegria, dos cinco participantes, nenhum ganhou um lar definitivo ainda. Mas a coordenação do projeto firmou parceria com um adestrador profissional depois da pesquisa e percebeu que os cães adestrados estão sendo adotados com mais facilidade.
Outros resultados importantes do estudo foram que cães de abrigo abanavam a cauda por mais tempo durante as aulas e que o comportamento das pesquisadoras influenciava e muito no aprendizado.
Se as treinadoras usassem um tom de voz mais repressivo, os animais até atendiam rápido, mas abanavam menos a cauda e ficavam mais distantes delas. Por outro lado, se elas sorrissem, os animais respondiam mais rápido e prestavam mais atenção.
Aliás, isso funcionou para todos os cães, sejam de abrigo ou não. Maria Luiza conta que vários parâmetros foram usados pra medir o bem-estar dos animais durante o processo. O melhor deles é o “tempo de abanamento de cauda.”
“Nós gravamos as sessões com câmeras e depois usamos um programa para decodificar o comportamento. O cão começou a abanar a cauda, a gente aperta um botão. Parou, apertamos outro. E assim a gente mediu esse tempo, que foi maior quando a pesquisadora sorria pra eles", contou.
Para os tutores de pet, a pesquisa também deixa pistas importantes sobre o relacionamento humano e animal.
“É importante focar no treinamento, ter disciplina, mas sempre ir pelo caminho da recompensa. Usar algo que o animal gosta pra recompensar, como um petisco, uma fruta e até um carinho. E se for um problema mais difícil, mais complicado de comportamento, procure ajuda profissional”, ensina a bióloga.
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