No início de 2020, a vida de professores e estudantes de escolas e universidades no mundo inteiro virou de pernas para o ar. Em pouco tempo, todos tiveram que se adaptar a um modelo de ensino virtual com o qual tinham pouco ou nenhum contato, devido à pandemia de Covid-19. Hoje, quase um ano depois, professores continuam se desafiando para manter os alunos interessados nas disciplinas, e acabaram descobrindo uma vantagem na educação à distância: a facilidade para divulgar o conhecimento produzido na universidade pública.
Embora a falta de acesso à tecnologia ainda seja um grande impasse para que o ensino remoto possa ser considerado uma realidade viável a longo prazo em todo o país, profissionais conseguem fazer proveito das ferramentas para contribuir para a democratização da educação no Brasil. Enquanto alguns professores já publicavam suas aulas em plataformas públicas e que podem ser acessadas em qualquer lugar, outros tiveram que adaptar projetos já existentes a essa realidade, e acabaram encontrando vantagens na modalidade virtual.
A última situação é o caso de Bernardo Lins Brandão, professor de literatura grega antiga na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), que, acostumado a dar aulas presenciais, resolveu publicar o conteúdo no YouTube durante a pandemia. “A UFMG deixou que os professores escolhessem a plataforma, e pensei que ele seria uma boa ideia por ser de fácil acesso, e por permitir a divulgação do trabalho que está sendo feito na universidade”, conta.
Já o projeto Apoio Pedagógico, da Faculdade de Letras da UFMG, já existia há anos e teve que se adequar à nova realidade. Hoje, os cursos ofertados pelos professores do projeto são disponibilizados no YouTube podem render certificados a participantes de dentro ou de fora da universidade. A iniciativa também oferece cursos na plataforma Google Classroom, que têm limites de vagas.
Tanto o professor Bernardo Brandão quanto a professora Heloísa Maria Moraes Moreira Penna, coordenadora do Apoio Pedagógico, citam a surpresa que tiveram quando receberam mensagens de internautas de várias partes do país, contando que haviam encontrado as aulas publicadas nas plataformas e estavam estudando o conteúdo por conta própria.
“Do interior de Minas, do Acre, do Amazonas, de estados do Sul: gente do Brasil inteiro vê as aulas e participa dos cursos”, conta Heloísa. Na última semana, Bernardo se surpreendeu ao ser citado na publicação de um estudante da Universidade de Barcelona, na Espanha, que assistiu às suas aulas no YouTube para se aprofundar em uma disciplina que estuda na faculdade.
“Algumas pessoas compartilham as aulas nas redes sociais e elas chegam para mais gente, e outras procuram pelos tópicos na internet e encontram os vídeos, que são públicos. Durante a pandemia, temos visto um aumento no interesse por conteúdos de humanidades, muitos querem se aprofundar na vida intelectual, e tem tanta coisa para aprender no YouTube. É revolucionário”, pontua o professor da UFMG.
O Apoio Pedagógico resolveu, ainda, criar um formulário para que os alunos dos cursos preencham detalhes sobre suas formações, idades, interesses e ocupações, para conhecer melhor quem está acessando o conteúdo ofertado na internet. “Temos professores da rede pública, jovens se preparando para o ENEM, alunos da própria UFMG… Recebemos feedbacks, sugestões, e fazemos avaliações a partir desses resultados”, explica a coordenadora do projeto.
Para os dois professores, a aderência ao ensino remoto e a disponibilização do conteúdo ao público permitiu que o trabalho que a universidade pública faz no Brasil fosse divulgado e valorizado. “A universidade faz uma ponte com a sociedade, e uma das vocações dela é estimular o ensino, a pesquisa. Em tempos de ataques à universidade pública, é importante mostrar que existe um trabalho sério sendo produzido por ela”, defende Bernardo.
“Essa iniciativa mostra como o papel social da universidade, de retornar para a sociedade um produto de qualidade, está sendo bem cumprido”, completa Heloísa. Os dois docentes consideram, inclusive, continuar a divulgação das aulas de forma digital mesmo depois da pandemia, fazendo com que cada vez mais pessoas de todo o país tenham acesso ao que é produzido nas instituições públicas.
O professor de literatura cita, ainda, outros profissionais que também divulgam seus trabalhos de forma pública na internet: Caetano Galindo, professor de história da língua portuguesa na UFPR (Universidade Federal do Paraná); Fernanda Cavalcante, professora de microbiologia na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro); Renato Vidal, professor de matemática na UFMG; e Juliana Bastos, professora de história antiga na Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro).
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