O relaxamento das medidas de isolamento social e o aumento das aglomerações nos últimos feriados pode ter relação com a elevação no número de mortes por Covid-19 registradas em datas posteriores em algumas partes do Brasil. Cerca de 14 dias após o feriado de 7 de setembro, a quantidade de óbitos subiu em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, de acordo com um estudo realizado pela Kunumi, organização dedicada ao desenvolvimento de inteligência artificial. O cenário se repetiu após o feriado de 12 de outubro.
"Conseguimos notar o impacto das medidas de relaxamento na taxa de mortalidade em 14 dias, a curva tem uma acentuação maior após os feriados. Presumimos que isso ocorre porque mais gente entrou em contato nessas datas", afirma a diretora da Kunumi, Gabriella Seiller.
Em Minas Gerais, de acordo com dados do painel de monitoramento do coronavírus da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), o recorde de óbitos por Covid-19 após 7 de setembro ocorreu 14 dias depois, no dia 21, quando 75 pessoas morreram. Já em outubro, os dados mais recentes apontam que, após o feriado do dia 12, o dia 25 foi o que registrou maior número de óbitos (47). Os números consideram a data de ocorrência dos óbitos, e não de notificação.
Segundo o infectologista Carlos Starling, membro do comitê de enfrentamento da pandemia da Prefeitura de Belo Horizonte, os casos de infecção por coronavírus geralmente surgem por volta de sete a dez dias depois de períodos de maior aglomeração. Já o período de ocorrência dos óbitos pode variar. "Pacientes que desenvolvem formas mais graves acabam evoluindo para óbito por volta de duas a três semanas depois da infecção. Alguns morrem por complicações da assistência até um, dois meses depois", explica.
De acordo com o médico, em Belo Horizonte, não foram verificados aumentos no número de mortes por Covid-19 após os últimos feriados. "O que temos observado é uma queda do número de casos e de óbitos, tanto que as enfermarias e UTI estão com ocupação abaixo de 40%", pontua.
Procurada pela reportagem, a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) informou que, considerando as datas em que as mortes por Covid-19 ocorreram, "foi observado que não existe um aumento do número de óbitos em um período pós feriado".
Segundo a pasta, o que ocorre é um aumento de notificações dos óbitos no período. "Isso deve ocorrer pois em fins de semana e feriados os sistemas de saúde e secretarias trabalham em escala reduzida, o que impacta a notificação do dado nos sistemas oficiais. Com isso, os óbitos que ocorrem durante feriados são incluídos nos sistemas oficiais ao longo das semanas seguintes, o que dá a falsa sensação de aumento de óbitos", afirmou a SES-MG.
Fatores que influenciam mortalidade mudaram com o tempo
Os fatores que mais impactam na variação das taxas de mortalidade por Covid-19 em Minas Gerais vêm mudando ao longo da pandemia, de acordo com dados da plataforma de inteligência artificial da Kunumi, desenvolvida em parceria com o Laboratório de Inteligência Artificial da Universidade eFederal de Minas Gerais (UFMG).
Em 16 de julho, a principal variável que influenciava negativamente a taxa era o número acumulado de casos recuperados, que estava em 273,66 por 100 mil. Além disso, enquanto no Brasil a queda média de mobilidade nas estações de transporte era de 39,81%, em comparação com o período anterior à pandemia, no Estado a redução era de 28%.
Já em 27 de setembro, quando Minas Gerais registrava tendência de queda de mortes, o número acumulado de casos recuperados, que avançou para 1.195,61 a cada 100 mil, passou a influenciar positivamente na variação da taxa de mortalidade.
Segundo o engenheiro de software e desenvolvedor de machine learning da Kunumi, Gustavo Mamede, considerando todos os dados, o estudo concluiu que um dos fatores que exerce influência na taxa de mortalidade no Estado é o fato de a proporção da população na faixa de 40 a 49 anos ser maior em Minas Gerais do que na média nacional: 13,62% do total ante 12,28% no Brasil. "É uma população potencialmente assintomática. Com a falta de adesão ao isolamento e essa diminuição abaixo da média da mobilidade, devem ser pessoas que podem estar espalhando o vírus", diz.
Já entre os fatores positivos, está a disponibilidade de leitos de UTI nos municípios mineiros. Dados de 21 de agosto da plataforma indicam que havia 14,94 leitos por 100 mil habitantes, acima da média nacional, de 12,78. Além disso, Minas Gerais tem uma população urbana de 85,29%, ante a média nacional de 80,20%, mas apenas 14,21% vive em aglomerações de mais de 1 milhão de pessoas.
"Isso contribuiu para diminuir o número de mortes em Minas: a população está em área urbana, o que facilita o acesso a recursos de saúde, mas menos aglomerada e mais distribuída em várias cidades, não só em Belo Horizonte", conclui Mamede.
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