Foi na França que o casal de artistas plásticos Álvaro Apocalypse e Tereza Veloso conheceu o teatro de bonecos e resolveu acender as luzes do espetáculo para este tipo de apresentação no Brasil. Tudo começou de forma intimista, dentro de casa, fazendo a produção dos bonecos para os filhos, mas logo a novidade despertou o interesse da vizinhança e não parou mais de crescer.
A brincadeira de família se tornou, logo depois, o Giramundo, que constrói bonecos e espetáculos, ressaltando as características da cultura brasileira. Já foram montadas mais de 30 peças. O acervo do grupo ultrapassa mais de 1.500 bonecos, que rodaram o Brasil e o mundo. E, neste mês de outubro, o grupo completa 50 anos de trajetória.
Todo esse trabalho começou em uma oficina na casa da família, em Lagoa Santa, na região Central de Minas. Mas os bonequinhos feitos em casa só se tornaram conhecidos após o convite de um amigo para que Álvaro e Tereza se apresentassem ainda na capital mineira, em outubro de 1970. A primeira apresentação foi no Teatro Marília.
Beatriz Apocalypse é filha do casal fundador do grupo e hoje é uma das responsáveis pelo Giramundo. Ela lembra que, na época da primeira apresentação, o grupo nem tinha nome.
"Quando eles saíram de Lagoa Santa e vieram para Belo Horizonte veio aquela história de 'vamos ter que inventar um nome'. O que meu pai contava era que cada um foi dando um nome e eles foram escrevendo, até que ele lembrou de um boi da cidade dele, em Ouro Fino, no Sul de Minas, chamado Giramundo", lembra ela.
O grupo carrega ainda a influência nas artes plásticas, onde os elementos cênicos são criados a partir de princípios do desenho, escultura e pintura.
Espetáculo 'As Aventuras de Alice no País das Maravilhas', do Giramundo, com a participação da cantora Fernanda Takai. — Foto: Bia Apocalypse / Divulgação
"Alice no País das Maravilhas", "Os Orixás" e "A Bela Adormecida" são apenas algumas das apresentações feitas pelo coletivo, que foi se adaptando ao tempo, mas sem perder a essência. A tecnologia pediu passagem e bonecos em múltiplos aspectos e movimentos, além de imagens digitais, foram integrados aos espetáculos. Vídeos também passaram a ser usados nas apresentações.
O grande desafio chegou em 2003, após o falecimento dos fundadores. Álvaro Apocalypse estava se dedicando à criação de uma apresentação sobre o boneco "Pinóquio", mas não concluiu os trabalhos. Mesmo com o apoio de um patrocinador, os novos diretores optaram por não seguir com o projeto e elaboraram um novo espetáculo.
O resultado foi a junção de todas as experiências técnicas vividas durante os 30 anos de experiência do Giramundo e testes com novas possibilidades. Um dos diretores, Ulisses Tavares, lembra que sugeriu usar uma tela junto com os bonecos.
"Eu tinha assistido um espetáculo do Grupo Corpo, que tinha uma tela translúcida, onde eles trabalhavam com ela fazendo efeitos, e dentro dessa nossa proposta de passear pelas técnicas que o Giramundo já tinha visitado tinha o Teatro Sombras, então para a gente montar uma grande tela e fazer todo aquele aparato no meio de uma peça, traria uma grande confusão para dentro do palco, por isso eu sugeri a gente trabalhar com essa tela a primeira vez e, então, nos aventuramos a fazer animações dentro do teatro, em tempo real, com o Pinóquio", conta o diretor.
Recentemente, as mãos acostumadas a operar os bonecos tiveram que se adaptar. Mais de 25 pessoas autônomas se reinventaram por conta da pandemia e passaram a produzir máscaras, quadros e camisetas para arrecadar dinheiro. Além disso, foi realizada uma série de lives.
O Giramundo conta ainda com um museu, de quase duas décadas, dedicado exclusivamente à preservação do acervo e história. Para o futuro, os responsáveis pelo Giramundo acreditam que o teatro de bonecos vai se unir ainda mais ao audiovisual. O espetáculo pirotécnico "Zacarias", por exemplo, será transformado em filme, já que por causa do coronavírus não pôde ter as apresentações presenciais.
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