Uma professora do curso de engenharia de materiais Cefet-MG está sendo acusada de praticar assédio moral contra alunos da instituição. Com o retorno das atividades, por meio de ensino remoto, a docente tem feito exigências consideradas “absurdas” pelos estudantes, além de intimidá-los. O Cefet afirmou que a docente foi orientada e a decisão não reflete a posição da instituição.
Em e-mail enviado para os estudantes, a educadora explica como será feita a avaliação da disciplina. “TODOS os alunos deverão permanecer conectados e com a câmera ligada para que a presença seja confirmada a partir da aula de segunda”, exigiu.
No entanto, o próprio Cefet orientou os alunos, em uma publicação no site, sobre a não obrigatoriedade de câmera e microfone nas atividades. “[O aluno] pode participar das aulas síncronas sem ter um microfone ou câmera ligados ao seu computador”, definiu.
Na mensagem enviada aos estudantes, a professora ainda se mostra intolerante com problemas técnicos na conexão. “Caso o aluno fique sem conexão, wi-fi, cabo, celular, etc. deverá comprovar via operadora que presta o serviço a falha no horário da aula para ter atividades repostas”, acrescentou.
O Dama (Diretório Acadêmico da Engenharia de Materiais do Cefet-MG) se pronunciou sobre a demanda da professora, por meio de nota no Instagram (leia na íntegra abaixo). O Dama relembrou a própria resolução publicada pela instituição. “As atividades avaliativas síncronas, que dependam de conectividade, devem prever possibilidades de substituição, a fim de atender estudantes que tenham algum problema de conexão”, citou.
Na mesma mensagem, a professora demonstra estranhamento com a quantidade de alunos matriculados. Por isso, ela ordena que os discentes façam uma justificativa de próprio punho sobre a escolha da disciplina. “Justificativa pressupõe que vocês me convençam de algo”, escreveu.
O diretório acadêmico também repudiou esse requerimento. “Todo aluno tem o direito de se matricular na disciplina que quiser, caso tenha os pré-requisitos para cursá-la e número de créditos disponíveis, sem a necessidade de convencer o professor dos seus motivos”, declarou.
A responsável pela disciplina ainda acrescentou que as provas serão orais e aplicadas sem agendamento prévio. No entanto, isso também não vai de encontro com a resolução do Cefet, que determina sobre os processos do Ensino Remoto Emergencial. “Deve-se priorizar a realização de atividades avaliativas no formato assíncrono”, orienta. “Os planos didáticos deverão prever datas e instrumentos avaliativos”, acrescenta o texto.
Um dos alunos da disciplina com quem a reportagem conversou relatou a sensação de insegurança dos estudantes. O discente preferiu não ser identificado, por medo de represálias na instituição. “A gente está em choque. A situação é lamentável”, desabafou.
Por meio do Diretório Acadêmico, a coordenação do curso foi acionada para apurar a situação. Após essa demanda dos estudantes, a professora voltou a contatá-los. Dessa vez, a docente abordou direito de imagem. “É terminantemente PROIBIDO gravar as aulas, áudio, fotos, etc. sem autorização. NÃO AUTORIZO qualquer tipo de publicação relacionada a minha pessoa”, escreveu.
“Caso isso aconteça, o aluno responderá legalmente por isso. Informo que é possível solicitar a quebra de sigilo telefônico de qualquer pessoa para comprovar a exposição da imagem de outrem”, acrescentou.
No texto do e-mail, a professora afirma que não é uma ameaça. No entanto, esse não foi o entendimento dos estudantes que receberam a mensagem. “Os alunos ficam mais intimidados ainda com um e-mail desses, porque parece que a gente não tem para onde correr. A gente fica desanimado de cursar, porque não era pra ser assim”, comentou.
Nas redes sociais, a manifestação do Cefet de que este seria um “caso isolado” não foi bem recebida pelos estudantes. Muitos acusaram a instituição de ter um histórico de assédio moral por parte de professores. Um outro aluno, que também preferiu não se identificar, relatou à reportagem que sente um ambiente de incerteza e falta de proteção ao aluno.
“Minha extrema preocupação com tudo que aconteceu nesse caso é que ele não foi isolado, não foi o primeiro e nem vai ser o último. O Cefet-MG, onde eu estudo desde o ensino médio, tem diversos casos que nunca deram em nada. Não se toma providências e deixa um ambiente que demonstra para o aluno que ele é obrigado a se submeter a certas atitudes impostas por professores”, desabafou.
@becca_ff apagaram o outro post, entao vou registrar novamente.
— Little Colleta (@brucoletinha) August 20, 2020
NADA vai acontecer. Vai ficar a mesma merda. Punição é algo que aqui infelizmente está em falta. Vão passar pano de novo, assim como já fizeram antes e farão novamente. Ainda tem a cara de pau de colocar “isolado”
“As resoluções foram feitas para criar um ambiente harmonioso entre docente e discentes, sem conflitos e divergências do padrão de ensino. O que acabou acontecendo é exatamente o contrário: alunos que fogem ao máximo, alunos que desistem da instituição e ficam com traumas psicológicos”, acrescentou.
Por meio de nota enviada à reportagem (leia na íntegra abaixo), o Cefet-MG afirmou que esse foi um caso pontual e isolado. “O docente foi orientado que esta postura não reflete a posição do Cefet-MG em relação à proposta de ensino remoto que se adotou, não havendo respaldo e nem previsão em quaisquer resoluções ou portarias exaradas pela Instituição no que tange a essa forma de ensino”, escreveu.
“A Direção Geral enfatiza que o processo de implementação do ensino remoto emergencial está sendo avaliado positivamente pela comunidade acadêmica, sobretudo levando em conta a expressiva participação dos estudantes”, concluiu.
A reportagem optou por preservar o nome da professora porque não conseguiu falar com ela até esta publicação. A reportagem tentou contato com a educadora 12 vezes, entre 8h e 9h desta sexta-feira, em números diferentes atribuídos a ela.
Após a publicação deste material, a educadora entrou em contato com a reportagem, mas não autorizou que nenhuma justificativa apresentada fosse publicada ao sinalizar que se manifestaria, posteriormente, por nota.
“Diante dos acontecimentos recentes relacionados à postura de docente da Instituição na condução do ensino remoto de disciplina ministrada em curso de graduação do campus Nova Suíça (BH), a Direção Geral do CEFET-MG informa que a chefia de departamento pertinente já se reuniu com docente e coordenação do curso para que o fato possa ser esclarecido, bem como as eventuais dúvidas sobre as resoluções relativas ao Ensino Remoto Emergencial (ERE) na Instituição. Ademais, destaca que o docente foi orientado que esta postura não reflete a posição do CEFET-MG em relação à proposta de ensino remoto que se adotou, não havendo respaldo e nem previsão em quaisquer resoluções ou portarias exaradas pela Instituição no que tange a essa forma de ensino.
A Direção Geral ressalta ainda que este é um caso pontual e isolado e, de nenhuma maneira, reflete a proposta de ERE que vem sendo elaborada, implementada e avaliada desde o dia 2 de julho, quando o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) do CEFET-MG, por meio da Resolução CEPE-02-20, aprovou, em caráter excepcional e temporário, a implementação de ERE para os cursos da Educação Profissional e Tecnológica de Nível Médio, para os cursos de Graduação e para os cursos de Pós-Graduação, em todos os campi da Instituição. Desde, então, a Comissão Geral e as comissões formadas em cada campus do CEFET-MG – com ampla representatividade de todos os segmentos da comunidade acadêmica – têm debatido a maneira mais adequada de construir, coletivamente, o ERE.
Em consonância com essa construção coletiva e sensível à necessidade de capacitar seus docentes para os desafios do ensino remoto, estão sendo realizados webnários e cursos direcionados a segmentos específicos da comunidade para tratar dos diferentes aspectos relacionados ao ensino remoto. Nesse sentido, vale ressaltar que, aos docentes, várias têm sido as ações de capacitação e orientação, como bate-papo com professores de outras instituições onde o ensino remoto já fora adotado; elaboração de “Trilhas do Conhecimento”, com roteiros sobre modelos de ensino híbrido, desafios e possibilidades do ensino remoto, ferramentas de auxílio aos docentes; palestra, curso e até um e-book sobre metodologias de aprendizado para o ensino remoto. Tudo isso com o intuito de contribuir para o planejamento das aulas, apresentar plataformas colaborativas, debater o papel do professor e da sala de aula nesse novo modelo, o planejamento de aulas síncronas e a avaliação do aprendizado.
Por fim, a Direção Geral enfatiza que o processo de implementação do ensino remoto emergencial está sendo avaliado positivamente pela comunidade acadêmica, sobretudo levando em conta a expressiva participação dos estudantes“.
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