Alunos de baixa renda vivem o drama de não saber como vão fazer para estudar neste ano. Diante da pandemia de Covid-19, escolas foram fechadas como medida de segurança para evitar aglomerações e a consequente propagação do novo coronavírus. A principal opção para que os estudantes não percam o ano letivo são as aulas virtuais. No entanto, nem todos têm computador com acesso à internet banda larga ou mesmo televisão em casa.
É o caso de Adriel Castro, de 18 anos, estudante do terceiro ano do ensino médio. Morador da ocupação Helena Silva, na região do Barreiro, em BH, e aluno da Escola Estadual Doutor Aurino de Morais, na região, ele sonha em ser professor de história. “Tem um lado da história que precisa ser contado da forma como as pessoas da periferia enxergam. Fica mais fácil para entender”, explica sua escolha.
Adriel vive o drama de não ter acesso ao conhecimento, por falta de estrutura tecnológica básica. Com internet apenas no celular e com plano de dados limitado, o jovem diz que, sem o professor para auxiliar a solucionar as dúvidas, a única alternativa que lhe resta é estudar por meio dos livros que tem do colégio. Diante desse cenário, ele defende que o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2020 seja adiado, para que todos os estudantes de classes sociais mais baixas tenham oportunidade de estudar para disputar vagas e não sejam excluídos. “O Enem só vai provar pra gente o quanto o exame tem sido elitista”, diz.
Na prática
A estudante do primeiro ano do ensino médio Vitória Oliveira de Andrade, de 16 anos, aluna da Escola Estadual Madre Carmelita, no bairro Bandeirantes, na região da Pampulha, tem TV em casa, mas não conta com internet. Em janeiro, a casa da avó, em Ribeirão das Neves, foi afetada pelas chuvas. Então a estudante levou a avó para morar com ela e a mãe em um imóvel alugado com a ajuda de familiares e amigos, no bairro Glória, na região Noroeste de BH.
Sem internet em casa, a solução seria ter aulas pela TV, como propõe o governo. Mas a adolescente não acredita que esta seja a melhor solução. “Você não consegue interagir de imediato com o professor se tiver alguma dúvida. A aula online às vezes seria mais fácil para você fazer isso”, avalia.
Uma possibilidade levantada pela unidade em que a aluna estuda é a disponibilização de computadores na escola para os alunos que não têm acesso. “Não temos carro em casa, então eu teria que ir de carro de aplicativo ou de ônibus (até a escola). Teria contato com outras pessoas”, conta a garota, que tem receio de que a avó, no grupo de risco da doença, seja contaminada.
Curso preparatório
A crise gerada pela pandemia de coronavírus não deixou sair do papel o cursinho preparatório para o Enem organizado pela Associação Metropolitana dos Estudantes Secundaristas da Grande Belo Horizonte, que tem 20 professores voluntários. A ideia seria oferecer aulas presenciais a estudantes de baixa renda do terceiro ano do ensino médio, mas o cursinho vai funcionar temporariamente de forma virtual, aberto a qualquer público.
No entanto, segundo Rafael Morais, presidente da associação, há grande dificuldade de conectividade entre os alunos de classes sociais mais baixas. “Como um estudante que tem apenas rede 3G, limitada, vai fazer aula pela internet, sem o computador? A gente sabe que é difícil pelo celular, ainda mais pelos aparelhos menos modernos”, disse.
Pendência judicial
Apesar do planejamento do governo do Estado, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais deferiu, na última quarta-feira, liminar impetrada pelo Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE-MG) para barrar a volta presencial dos profissionais da educação aos prédios da rede.
Até que o Estado apresente um plano para garantir a saúde dos servidores, nem os professores poderão ser convocados a retornar às escolas, e, portanto, as transmissões pela TV também estariam impedidas.
Governo não vai conseguir alcançar todos
Na última quarta-feira (15), a secretária de Estado de Educação, Julia Sant’Anna, anunciou que, além das apostilas que serão distribuídas de forma online e física aos estudante mineiros, aulas vão ser transmitidas pela TV, pela Rede Minas. Ao todo, cinco horas de programação da emissora serão destinadas às aulas, sendo uma hora para resposta de dúvidas dos estudantes. As aulas vão começar em maio e vão ser disponibilizadas no YouTube.
A Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE-MG) tem ciência de que, mesmo com as duas alternativas, não vai alcançar todos os alunos de escolas públicas. Isso porque, no caso da Rede Minas, o sinal chega a apenas 186 dos 853 municípios do Estado, o que representa uma cobertura de 22% das cidades de Minas Gerais. A expectativa é que as aulas estejam disponíveis a cerca de 1 milhão do 1,7 milhão de estudantes mineiros, deixando cerca de 42% dos alunos sem acesso às aulas remotas propostas pelo governo.
Questionada pela reportagem, a SEE informou que, para aqueles alunos que não têm acesso à internet, as escolas e Superintendências Regionais de Ensino vão identificar a melhor forma de distribuição do material didático. Segundo a pasta, um aplicativo com navegação gratuita também deve ser lançado para tirar dúvidas e promover a interação do professor com os estudantes. A ferramenta ainda não tem data para ser lançada.
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