Em 2018, o esporte brasileiro foi tomado pelo furacão Tiffany Abreu. Ela se tornou a primeira mulher transgênero a disputar a Superliga de vôlei em meio a aplausos e protestos. Ela também virou inspiração para pessoas como Marcelo, que tomou coragem para trilhar caminho inverso: profissional do futebol feminino, se aposentou para seguir o desejo de atuar no masculino.
Marcelo Nascimento Leandro, 31 anos, cresceu em Sete Lagoas (MG) e herdou a paixão pelo futebol do pai Juarez Leandro, que também jogou profissionalmente. No futebol feminino, defendeu clubes tradicionais como Santos e Corinthians — onde foi campeão brasileiro em 2018. Apesar do sucesso, tomou uma decisão para a vida: iniciaria a transição de gênero.
— Frequento psicólogos desde 2015 e faço terapia. Meu impasse era sobre seguir a carreira no futebol feminino ou fazer o tratamento hormonal e não jogar. Ano passado decidi não continuar no futebol — conta.
Marcelo está sem clube desde agosto de 2019, quando rescindiu com o Corinthians e retornou à cidade natal para iniciar a transição: os passos são tratamento hormonal e retificação de nome e gênero em cartório — que tem previsão para ficar pronta nesta quarta-feira, exatamente no Dia Nacional da Visibilidade de Transexuais e Travestis.
— Tenho consulta de três em três meses com endocrinologista. Tomo dose de testosterona a cada 21 dias. Fiz acompanhamento com médicos, várias coisas para a saúde. Muita gente é preconceituosa. Deveríamos analisar jogadores de futebol por serem bons na atividade. Quem pensa de forma diferente está equivocado — conta Marcelo, que não teme o preconceito.
Enquanto as portas do futebol masculino não são abertas — Marcelo precisa estar um ano registrado com o novo gênero —, os times femininos seguem tentando contratá-lo.
De acordo com a legislação, “todo atleta tem direito de praticar esporte dentro do gênero com o qual se identifica”. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) segue as regras determinadas pelo Comitê Olímpico Internacional e pela Wada. Ou seja, em tese, não há impedimento que faça Marcelo não disputar o futebol masculino.
— Se você nasceu homem e vira trans feminina, tem problema com a testosterona pelo ganho acumulado. Mas se você é mulher e virou atleta trans masculino, não tem problema. Não existe nenhum impedimento, nem do COI nem da Conmebol — declarou Fernando Solera, coordenador da comissão médica e de combate a dopagem da CBF.
O COI estabelecia três requisitos para mulheres trans atuarem em eventos femininos: mudança de sexo com cirurgia, terapia hormonal e reconhecimento legal da mudança. Porém, em 2015, houve alterações — a cirurgia deixou de ser obrigatória e o nível de testosterona precisa ser menor que 10 namonol durante um ano. Porém, não há impedimentos para a troca do feminino para o masculino.
— Se ele entrar com uma documentação solicitando essa alteração, nós vamos liberar. Tem que vir um documento médico fidedigno, com documentação laboratorial recente. A partir do momento que isso entra na CBF, a gente checa — declarou Solera, que também é membro da câmara técnica de medicina no esporte do Conselho Federal de Medicina.
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