De Minas para todo o universo da fé. Centro espiritual, histórico, ambiental e paisagístico com mais de 250 anos de peregrinações e visita anual de cerca de meio milhão de pessoas, o Santuário da Serra da Piedade, em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, quer ser patrimônio da humanidade. A iniciativa, que ganha adesões e já tem um grupo trabalhando para encaminhar o projeto à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), foi divulgada, ontem, no topo do maciço, durante a cerimônia comemorativa dos 58 anos de oficialização de Nossa Senhora da Piedade como padroeira do estado. “Minas tem quatro locais já reconhecidos pela Unesco e apoiamos essa boa ideia, pois aqui temos a magnífica arquitetura divina”, afirmou o arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira de Azevedo.
A festa em homenagem à padroeira teve início às 14h, com a inauguração, ao ar livre, da revitalização da Praça Dom Cabral, custeada pela Prefeitura de Caeté e com aprovação da Câmara Municipal. Em seguida, houve uma procissão com a réplica da imagem da santa que está no altar da ermida e outra de São José, da praça até a Basílica Ermida da Padroeira de Minas Gerais – Nossa Senhora da Piedade, construída no século 18 e que abriga a peça barroca original esculpida por Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814). No templo, às 15h, dom Walmor presidiu a missa, concelebrada pelo reitor do santuário, padre Fernando César do Nascimento, e pró-reitor padre Carlos Antônio da Silva. Até 15 de setembro, período do jubileu, o clima é de festa, com ampla programação (veja quadro).
Ao abençoar o espaço inaugurado ontem – tem agora um painel eletrônico para dar informações, inclusive a temperatura – e aspergir água benta sobre os presentes, dom Walmor destacou a data de 31 de julho de 1960, quando houve festa na Praça da Liberdade, na capital, após decisão do Vaticano “Estamos aqui 58 anos depois comemorando a oficialização dessa consagração de Nossa Senhora da Piedade como padroeira do estado. Este lugar é um patrimônio da devoção do povo de Minas e, especificamente de Caeté, que tem cuidado do seu patrimônio e zelado pela preservação”, afirmou. Ele ressaltou ainda que a Praça Dom Cabral homenageia o primeiro bispo de Belo Horizonte, dom Antônio dos Santos Cabral (1884-1967).
Operários que trabalharam em canteiro de obras no santuário carregaram os andores com as imagens de Nossa Senhora e São José na procissão até a ermida (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Acompanhando o arcebispo na procissão até a basílica, o padre Fernando César lembrou que a comemoração dos 58 anos é uma referência para todo o país, de forma especial nesses tempos de crise, pelo respeito, religiosidade e dignidade à padroeira e ao território sagrado. Ao lado, o pró-reitor acrescentou que se trata de um “chamado” para que as pessoas tomem consciência da realidade em que estão vivendo e citou também o momento de crise. “É um exemplo de fé que Minas oferece ao país”, afirmou.
PROJETO O prefeito de Caeté, Lucas Coelho Ferreira (PTB) é um dos articuladores do projeto para tornar a Serra da Piedade um patrimônio da humanidade, como já ocorreu, em Minas, com o Centro Histórico de Ouro Preto e o Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, ambos na Região Central, o Centro Histórico de Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, e o conjunto moderno da Pampulha, que conquistou os títulos de Patrimônio Cultural e Paisagem Cultural da Humanidade, há pouco mais de dois anos.
“A Serra da Piedade, sem dúvida, é o ponto mais bonito de Minas e um dos mais belos do país. Além de ser um lugar de espiritualidade, atrai o turismo, recebendo cerca de 500 mil pessoas por ano. Para nós, de Caeté, é muito bom, pois com todos os benefícios feitos aqui, desde que dom Walmor assumiu a arquidiocese, a região é conhecida no mundo inteiro”, disse o prefeito. Ele informou que vem tratando, inclusive com políticos, para que a ideia se concretize.
Com o neto Pedro, dona Geralda pediu graças e paz para o mundo (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
A revitalização da Praça Dom Cabral ficou em R$ 150 mil, pagos pela prefeitura com autorização do Legislativo municipal. “Nós ainda fazemos pouco por um lugar que é chamado de magnífica arquitetura divina”, explicou o chefe do Exercutivo. O serviço incluiu a troca do piso de todo o espaço e instalação de dois arcos de metal, que dão acesso ao topo da serra. Já a arquidiocese de BH mandou instalar um painel de LED, que trará informações para os visitantes e mostrará a temperatura ambiente. Ontem, na estreia, embora ainda sendo regulado pelos técnicos, o equipamento apontou 12 graus. Nesse clima, ora frio, fora quente, quando o sol surgia entre as nuvens, dom Walmor, o reitor do santuário e o prefeito de Caeté descerraram uma placa comemorativa.
FESTA DA FÉ - Durante a procissão até a ermida, um dos momentos mais emocionantes foi ver os andores de Nossa Senhora da Piedade e São José carregados pelos operários que trabalharam na revitalização da Praça Dom Cabral. Eles estavam com seus uniformes e capacetes e, à frente, seguiam as freiras da Congregação das Irmãs Auxiliares de Nossa Senhora da Piedade (Ciansp), que atuam no santuário.
Revitalizada, a Praça Dom Cabral foi reinaugurada durante a festa (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Quando as imagens chegaram à entrada da ermida, muitos fiéis fizeram seus pedidos e aproveitaram para tirar fotos. “A primeira vez que vim à Serra da Piedade foi em 1955, no meu batizado. Desde então, estou sempre aqui”, contou o agrimensor Valdir Bartolomeu Rodrigues, de 63 anos, acompanhado da mulher Geralda Ferreira Lima e do neto Pedro, de 4, moradores do Bairro São Bernardo, na Região da Pampulha, em BH. Carregando o neto, Geralda fez questão de tocar a imagem e pedir muitas graças e paz para o mundo. Também residente em BH, a aposentada Mariana Costa Santos Cruz, do Bairro Santa Terezinha, na mesma região, disse que ontem era um dia muito especial e que, o mais importante é “entender, no dia a dia, as graças que Deus nos dá”.
A história do Santuário Nossa Senhora da Piedade começa no século 18, com o relato de um milagre: a Virgem Maria teria aparecido para duas jovens no alto da serra. A partir desse dia, o fato se espalha rapidamente. O episódio toca o coração do português Antônio da Silva Bracarena, então na colônia para ganhar dinheiro. Mas ele se converte e decide dedicar sua vida à construção de uma capela no lugar onde ocorrera o milagre. O singelo templo dedicado a Nossa Senhora da Piedade começa a ser erguido em 1767 e, mais tarde, ganha a imagem esculpida por um jovem de Ouro Preto, depois reconhecido como o mestre do Barroco mineiro Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. No ano passado, foram celebrados os 250 anos de peregrinação.
Foto: Arquivo O Cruzeiro/EM/DA Press
De acordo com a Arquidiocese de Belo Horizonte, a consagração de Minas Gerais a Nossa Senhora da Piedade ocorreu em 31 de julho de 1960, durante uma grande festa na Praça da Liberdade, após o Papa João XXIII, hoje santo da Igreja, reconhecer que Maria, com o título de Senhora da Piedade, é a padroeira do estado. Com o reconhecimento, o pontífice acolheu um pedido dos bispos mineiros, de modo especial do cardeal dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta. O religioso, conhecido como Cardeal Motta, foi arcebispo de São Paulo e Aparecida (SP), mas cresceu no alto da Serra da Piedade, acompanhando de perto as grandes peregrinações do povo mineiro ao local (foto). Tombada pelo estado, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e pelo município de Caeté, a Serra da Piedade é ponto de partida e chegada do Caminho Religioso da Estrada Real (Crer), que liga o santuário da padroeira de Minas a Aparecida (SP), onde está a imagem da protetora do Brasil, Nossa Senhora da Conceição Aparecida.
Por Gustavao Werneck - Estado de Minas
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